O Comitê de Política Monetária (Copom) anunciou nesta quarta-feira (20) mais um corte de 0,50 ponto percentual (p.p.) da taxa básica de juros (Selic), para 12,75% ao ano.
No comunicado, o colegiado indicou que a decisão aconteceu diante do processo de desinflação, dos cenários econômicos avaliados no Brasil e no exterior e do balanço de riscos.
A leitura, segundo especialistas consultados pelo g1, foi a de que o colegiado reconheceu a melhora dos indicadores de inflação e da atividade econômica brasileira, mas que ainda ponderou a necessidade de execução das metas fiscais do país.
Nessa reportagem, você vai entender os seguintes recados deixados pelo BC:
Desaceleração dos preços e resiliência da economia brasileira
Fatores de risco nos cenários de inflação
Importância das metas fiscais
De olho no ambiente internacional
O que esperar agora?
Desaceleração dos preços e resiliência da economia brasileira
Entre os principais pontos trazidos pelo Copom estava a percepção sobre o atual cenário macroeconômico brasileiro — que, segundo especialistas, foi ponderado e não mudou drasticamente em relação aos sinais dados pelo colegiado na última reunião.
Em seu comunicado, por exemplo, o comitê reconheceu as recentes quedas da inflação subjacente (que desconsidera o impacto de fatores temporários ou preços muito voláteis), mas destacou a alta do indicador no acumulado de 12 meses.
De acordo com os últimos dados do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), o Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA) acumulou um avanço de 4,61% nos 12 meses terminados em agosto — em julho, essa alta era de 3,99%.
Além disso, o BC também reconheceu que a atividade econômica brasileira tem apresentado uma resiliência maior do que o esperado anteriormente, mas afirmou que “o Copom segue antecipando um cenário de desaceleração da economia nos próximos trimestres.”
“O Banco Central manteve, a grosso modo, a sinalização anterior. De modo geral, o cenário macroeconômico veio em linha com a expectativa e o Copom manteve o plano de voo dele”, afirmou a economista chefe da Sul América Investimentos, Natalie Victal.
Fatores de risco nos cenários de inflação
Outro ponto abordado pelo colegiado foram os fatores de risco que ainda existem para o quadro inflacionário brasileiro. Entre os fatores de alta, por exemplo, o comitê destacou:
uma maior persistência das pressões inflacionárias globais;
e uma maior resiliência na inflação de serviços do que a projetada em função de um hiato do produto mais apertado.
Já entre os riscos de baixa dos preços, os diretores do BC destacaram:
uma desaceleração da atividade econômica global mais acentuada do que a projetada;
e os impactos do aperto monetário sincronizado sobre a desinflação global se mostrarem mais fortes do que o esperado.
Segundo o BC, as expectativas de inflação apuradas pelo Focus, relatório que reúne as projeções de diversas instituições financeiras para os principais indicadores econômicos do país, estão em 4,9% para 2023, 3,9% para 2024 e 3,5% para 2025.
Já as projeções do Copom em seu cenário de referência estão em 5,0% para 2023, 3,5% para 2024 e 3,1% em 2025. “As projeções para a inflação de preços administrados são de 10,5% em 2023, 4,5% em 2024 e 3,6% em 2025”, completou o comunicado.
Importância das metas fiscais
Segundo especialistas, a importância do controle do cenário fiscal também continua como um ponto de atenção por parte do Copom.
“Tendo em conta a importância da execução das metas fiscais já estabelecidas para a ancoragem das expectativas de inflação e, consequentemente, para a condução da política monetária, o Comitê reforça a importância da firme persecução dessas metas”, disse o colegiado no comunicado.
Para o diretor responsável pela área de pesquisa macroeconômica da Kínitro Capital, João Savignon, a inserção do debate sobre a importância da execução das metas fiscais tornou o comunicado “ligeiramente mais duro”.
“Mesmo não sendo explícito, [esse recado] pode ser interpretado como mais um condicionante para o Copom acelerar o ritmo de cortes de juros à frente”, disse o executivo.
“O Copom não colocou [a questão fiscal] no balanço de riscos, mas fez um alerta da importância de cumprir e perseguir as metas traçadas. Isso ajuda no processo de afrouxamento da política monetária, de cortes da Selic”, acrescentou o economista chefe da Western Asset, Adauto Lima.
De olho no ambiente internacional
Por fim, outro recado importante deixado pelo BC diz respeito ao cenário internacional. No comunicado, por exemplo, o colegiado destacou que o ambiente externos se mostra “mais incerto”, com a continuidade do processo de desinflação — mesmo com os indicadores subjacentes ainda elevados — e resiliência nos mercados de trabalhos de diversos países.
“Os bancos centrais das principais economias permanecem determinados em promover a convergência das taxas de inflação para suas metas”, disse o colegiado, destacando que notou a alta dos juros de longo prazo nos EUA e a perspectiva de menor crescimento na China, “ambos exigindo maior atenção por parte de países emergentes.”
Segundo o analista de investimentos da Aware Investments Leandro Ormond, além de as Treasuries (títulos do Tesouro norte-americano) de 10 anos terem atingido o maior patamar desde 2007, a China, o principal parceiro comercial do Brasil, apresentou dados “decepcionantes no primeiro semestre”.
Além disso, acrescenta ele, a inflação em níveis elevados na Europa também contribui para que haja uma interpretação por parte do mercado de que as taxas de juros ficarão altas por mais tempo.
Nesta quarta-feira, o Federal Reserve (Fed, o banco central norte-americano) decidiu manter a taxa básica do país inalterada entre o intervalo de 5,25% e 5,50%. A instituição sinalizou, no entanto, que uma nova alta dos juros deve vir à frente e que a política monetária dos Estados Unidos deve se manter restritiva ao longo do ano que vem.
“O cenário internacional se mostra um pouco mais complicado, tanto no âmbito financeiro quanto no geopolítico. […] Os movimentos nas taxas de juros dos EUA causam um impacto não apenas na economia local, mas também nas economias de todos os países, especialmente nas economias emergentes”, disse Ormond.
Ainda segundo o especialista, no entanto, vale ponderar que mesmo diante do quadro mais adverso no exterior, esse não foi um fator determinante para a decisão do Copom, por conta da melhoria geral dos indicadores internos nos últimos meses.
O que esperar agora?
Por fim, outro ponto importante sinalizado pelo Copom em seu comunicado nesta quarta-feira foi a sinalização sobre o que o mercado pode esperar das próximas reuniões do colegiado.
Na nota, o BC informou que a decisão de cortar a taxa básica de juros em 0,50 ponto percentual (p.p.) é “compatível com a estratégia de convergência da inflação para o redor da meta no horizonte relevante” e destacou que caso o cenário esperado pelo comitê seja confirmado, a expectativa é que novas reduções da mesma magnitude aconteçam nas próximas reuniões.
“Os membros do comitê, unanimemente […] avaliam que esse é o ritmo apropriado para manter a política monetária contracionista necessária para o processo desinflacionário”, afirmou.
Com isso, dizem especialistas, a principal expectativa fica, agora, pela ata do Copom, que deve ser divulgada na próxima semana.
“Fica a expectativa pelas informações sobre como o Banco Central avaliou a melhora dos indicadores de inflação de serviços”, disse Victal, da Sul América Investimentos.
“Além disso, também fica a dúvida se o diagnóstico quanto ao crescimento econômico é unânime entre todos os diretores. O mercado deve prestar bastante atenção para ver se tem alguma heterogeneidade de avaliações dentro do comitê”, acrescentou a economista.